quinta-feira, 15 de julho de 2010

Repensando a "periferia" metropolitana à luz da mobilidade casa-trabalho.

autora: Luciana Corrêa Lago

Ao longo dos anos, o acesso das "classes populares" à moradia e ao emprego formal tem diminuido, no que se configura como alterações no mundo do trabalho e no "mundo da vida", repercutindo sobre a dinâmica da vida urbana, em especial sobre as formas de integração à metrópole.
partindo da tese, divulgada por orgãos públicos e a mídia, de que estaria ocorrendo, no Brasil, uma crescente imobilidade espacial dos trabalhadores mais vulnerabilizados no interior das cidades.
Ao pensar sobre tal fenômeno, estão presentes três hipóteses:
1- O aumento da imobilidade dos trabalhadores estaria ligada ao crescimento da economia informal precária nas áreas periféricas, gerando uma descentralização econômica "perversa", ou seja, precariamente de "auto-subsistência".
2- O aumento da imobilidade estaria relacionado a um maior dinamismo econômico em sub-centros periféricos, através da expansão do capital, e consequentemente a um mercado de trabalho para os setores médios, gerando, ainda, uma economia informal de baixa qualificação.
3- O aumento de desocupados que não teriam condições de se deslocarem para os centros
em busca de trabalho, mantendo sua condição de desocupado.
As três hipóteses poderiam justificar a expansão das favelas nas zonas periféricas, assim como a densificação das já existentes nas áreas centrais e suburbanas na capital.
Nas metrópoles brasileiras (anos 70/80), verificou-se que os diversos tipos de integração econômica representaram a segregação na esfera do consumo, já que nem todos possuem condições financeiras de interagirem no âmbito do mercado, gerando desta forma a desigualdade de classes. A própria distribuição socioespacial dos sujeitos, ao longo dos anos, representou a dualidade centro-periferia com as suas peculiaridades, já que o Centro oferece todas as condições de acesso à cidadania em contraste com as ofertas de serviços nas regiões periféricas. Fomentando toda essa dualidade, encontra-se o Estado e a sua omissão frente à realidade das periferias brasileiras.
Cabe destacar que na conjuntura da década de 80, há uma grande reformulação nas periferias, seja pela crise econômica estatal, seja pela valorização das áreas periféricas consolidadas, dificultando o acesso aos segmentos mais abastados aos planos habitacionais.
Constata-se que no decorrer da década de 80 a situação socioeconômica desfavorável dos segmentos mais abastados foi fator que inviabilizou o acesso ao crédito, consequência da realidade econômica do país e instabilidade do emprego. O acesso ao mercado informal de moradia, via loteamentos populares, se deu de forma intensa.
A questão centro-periferia teve na segregação o seu principal vetor, em função da redução da distância física entre ricos e pobres, autosegregação das camadas superiores e médias, e pela segregação compulsória das camadas inferiores em espaços entendidos como disfuncionais para a economia urbana e de risco para a ordem urbana.
O modelo dualista homogeneizou vastas áreas nas metrópoles, ainda que o espaço metropolitano seja mais complexo do que o apresentado pelo núcleo-periferia.
A autora questiona se os novos arranjos territoriais na (re) produção das desigualdades sociais, nas metrópoles brasileiras representarão a redistribuição dos mecanismos de acesso a uma vida digna.
Os trabalhadores brasileiros, nas metrópoles em particular, vêem-se mais empobrecidos e vulneráveis quanto à renda e ao trabalho formal. Contudo, a autora destaca o Rio de Janeiro das demais metrópoles frente a este quadro socioeconômico. A perda de posição para São Paulo, desde os anos 40, no ranking das mais bem estruturadas metrópoles do país, é apontado como um dos motivos pelo qual a crise vem se agravando desde antes dos anos 80. Outro fator foi o deslocamento da capital para Brasília, na déc. de 60.
Esta instabilidade observada no Estado do Rio é entendida de duas formas: a perda da capacidade competitiva das indústrias a partir da migração das grandes empresas para São Paulo e Belo Horizonte e a perda de atratividade para alocar grandes empresas, sobretudo a partir da migração dos grandes bancos para São Paulo.
Tais acontecimentos, porém, não foram suficientes para afastar o Rio da segunda colocação entre os estados com maior concentração populacional e atividade econômica da Brasil. No entanto, este contou com o menor índice de taxa de crescimento demográfico, 1,1 % ao ano, frente a outras metrópoles. Outro dado aponta para uma parcela maior de trabalhadores em atividades manuais, entre os anos de 1991 e 2000, destacando-se o setor terciário. Tal dado aponta para uma maior precarização do trabalho na área metropolitana fluminense. Já entre os trabalhos que mais empregavam de forma ilegal (sem carteira) ou autônomos destacam-se em 2000, os operários da construção, os ambulantes, os prestadores de serviço especializados e os trabalhadores domésticos. (p. 8).
Já o setor primário, ou industrial, apresentou uma crise explicada pela diminuição dos postos de trabalho, sobretudo na indústria tradicional de 7% para 3,9%. A estas porcentagens somam-se os trabalhadores sem carteira e autônomos da indústria, que chegavam a 57% em 2000. Já os trabalhadores em serviços auxiliares a indústria tiveram um pequeno aumento. Estas percentagens referentes ao “mundo popular” tenderam a se manter estáveis na região metropolitana com exceção dos trabalhadores domésticos e da construção, que apresentaram queda em certas regiões e altas em outras.
No que se refere ao setor médio e superior, a autora apresenta destaque para maior participação dos trabalhadores se nível superior. Porém não há um padrão quanto às tendências assumidas nas diversas categorias profissionais. Aponta queda entre os funcionários públicos, elevação entre os profissionais do setor privado, tanto os empregados quanto os autônomos e um padrão no setor dos professores universitários. Já aqueles empregados nas atividades médias apresentaram queda frente aos profissionais da saúde e educação, que apresentaram aumentos em suas áreas.
A autora passa às alterações sócio-espaciais na metrópole do Rio de janeiro e aponta para uma configuração hierarquizada que expressa uma complexa estrutura social. Identifica uma dualidade núcleo-periferia extremamente polarizada do tipo superior e popular. Em seus pólos existem variações sociais que tiram seu esperado caráter homogêneo. Suas análises destacaram duas principais tendências na estruturação espacial na metrópole fluminense nos anos 80: nos espaços mais valorizados aponta-se a presença de elitização e favelização e nos espaços periféricos uma diversificação social em áreas restritas. Nas áreas elitizadas houve uma entrada massiva do capital imobiliário sendo responsável pelas mudanças do uso do espaço construído com maior parcela de profissionais de nível superior. Estas áreas tronaram-se cada vez mais restritas às camadas empobrecidas, gerando um crescimento das favelas locais e até o surgimento de novas favelas.
Já na periferia houve um movimento voltado a novos investimentos imobiliários, ocasionando uma mudança no perfil habitacional. Tal movimento é chamado pela autora de “expansão das fronteiras do núcleo” (p.10). Observa-se que juntamente com os padrões habitacionais também há um avanço nas condições de ensino das camadas médias sem, no entanto modificar o peso da classe operária e do setor de comercio nestas zonas. Para além dos empreendimentos imobiliários também se investiu, a partir dos anos 90, em Shopping Centers e, de forma parcial, em investimentos públicos.
Com relação aos anos 90, sob um contexto de ausência de políticas habitacionais voltados aos setores médios inferiores, houve um processo de elitização das áreas de habitacionais das camadas abastadas. O que se percebeu foi o aumento dos profissionais de nível superior o que configura uma elitização destes espaços. Tal processo acontece concomitantemente ao aumento da participação dos trabalhadores manuais em serviços especializados, indicando uma tendência a proletarização. Desta forma, o que se conclui é a permanente elitização das áreas nobres e conseqüente fechamento destas às camadas médias e proletárias.
Lançando olhar sobre as zonas operário/ popular, contatou-se um aumento relativo dos profissionais de nível superior e de trabalhadores manuais em serviços especializados, configurando uma diversificação social dentro desta classificação. Neste universo destacam-se áreas com elevada tendência do perfil social, como é o caso de Mangaratiba e Maricá. Estas cidades apresentam grande potencial para o turismo litorâneo, estando situadas na “Costa verde” “Costa do Sol”. Já em áreas de periferia distante, como Japeri, Itaguai e Paracambi, destaca-se um crescimento das atividades de trabalho inferiores (domesticas, prestadores de serviços e ambulantes).
Outro ponto abordado pela autora e a questão do fluxo diário casa- trabalho. Porém antes de introduzir tal questão, ela faz referencia a um indicador relevante para a sua abordagem. Assim, segundo o PNAD, houve uma evolução na taxa de desemprego, na metrópole do Rio de Janeiro entre os anos de 1992 e 2001. Desta forma, para uma abordagem das condições de acesso a bens e serviços urbanos referenciada no local de habitação é necessário considerar a parcela de desempregados. Percebe-se que nas áreas periféricas, era concomitante o percentual o crescimento dos setores médios empregados e de trabalhadores desempregados. Fica clara assim a tese da imobilidade dos pobres. Isso dado que estes desempregados das periferias estariam reféns dos autos preços das passagens do transporte público e impossibilitados de circular pela cidade.
Tomando as condições de mobilidade, percebe-se que a sua intensificação resulta da dinâmica de hierarquia territorial entre centros e subcentros econômicos, o acesso a transporte coletivo, referente ao itinerário, periodicidade e tarifas, além da disposição dos setores sociais segundos os bairros. Medir a distancia casa- trabalho e o tempo gasto neste percurso revelam os níveis de desigualdade social.
Embora entre os anos 1980 e 2000, não se tenha observado aumento nem redução no peso dos fluxos diários, de modo a induzir que não há uma questão de imobilidade dos trabalhadores, tais indicadores podem ser contestados. Isso dado que em geral, os trabalhadores dos municípios periféricos empregam-se na própria cidade onde reside. Desta forma a autora afirma que este fenômeno era e ainda é elevado entre as áreas de periferia.
Entre os dados dos trabalhadores que se deslocam de seu município para trabalhar/ estudar em outro, observa-se que há uma maior intensidade de circulação de mão de obra para municípios mais próximos entre sim, dentro da zona metropolitana. Contudo, a cidade do Rio de Janeiro continua atraindo o maior número de trabalhadores, seguido de Niterói.
A autora passa a utilizar dois municípios, Japeri e Nova Iguaçu, do modo a mostrar sua polaridade quanto aos dados de mobilidade pendular. O segundo apresenta um índice de trabalhadores que trabalham no próprio município de 61%, enquanto no primeiro esse cai para 45%. Ela parte então para as atividades laborais que se destacam nestes dois municípios. O que surge são ocupações localizadas de forma extrema na hierarquia social: ambulantes/ biscates e empregadores. Entre os que buscam trabalho em outros centros e cidades, destacam-se aqueles em ocupações de nível médio e domésticas.
Entre as classes médias vindas das áreas periféricas, a maioria não é absorvida pelo mercado de trabalho de suas cidades. Porém, entre os profissionais de nível superior e pequenos empregadores, houve uma maior absorção pelo mercado local. Assim, o que infere é uma “descentralização positiva”, segundo a autora, que caminha para as periferias de forma formal ou informal. No outro extremo, os trabalhadores mais pauperizados acabam em atividades no próprio município, dado a precariedade das condições salariais e de trabalho. Daí decorre a chamada “descentralização perversa”.





Por Pablo Landes, João Ricardo e José Aloísio.

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